quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Visões de Laura

Todos os dias Ana vai para sua aula de yoga e pilates, onde tenta manter o equilíbrio e de certa maneira sua forma.

Uma das características mais marcantes de Ana é a curiosidade, curiosa ao extremo não deixando passar nada sem desvendar.
Qualquer detalhe passa pelo filtro dela e com isso ela desenvolveu um hábito pouco cartesiano e quase nada saudável – ouvir as conversas das pessoas que estão ao seu redor, sem nenhum pudor, chegando a fazer as coisas mais bizarras para satisfazer seu pecado.

Desde que começou a freqüentar a academia, ela observou que dois homens, um com um pouco mais de 40 anos e o outro aparentemente entre 30 e 35 anos, chegavam por volta das dez horas da manhã, se sentavam no banco em frente ao salão principal e começavam a conversar. Ela ia para sua aula e uma hora mais tarde quando voltava os homens permaneciam do mesmo jeito, conversando como duas carolas que cochicham no banco da igreja antes do padre iniciar a missa.

Essa situação, é claro, atiçou a curiosidade de Ana, que mais que depressa iniciou um processo de investigação para saber: primeiro o que tanto conversavam aqueles dois, segundo: sobre o quê conversavam, e terceiro: que tipo de atividade eles realizavam ali.

Primeiro passo: questionou à recepcionista sobre a frequência dos dois e as aulas que eles participavam, e qual não foi a surpresa, pasmem, os dois não faziam atividade nenhuma, pagavam a academia e passavam cerca de uma hora e meia sentados conversando e depois desse tempo levantavam, sorriam para a recepcionista e saíam como se fosse a coisa mais natural do mundo.

Ao ouvir isso, Ana ficou muito mais empenhada em descobrir o fim dessa história, sua curiosidade a essa altura estava no estágio máximo, quase empolada, e concluiu que precisava descobrir o assunto das conversas e o motivo de estarem ali. Várias alternativas passaram por sua cabeça, assim como, a maneira como ela descobriria tudo.

Como era habitual ela resolveu tentar escutar o papo, no que teve sorte, pois o banco onde as vítimas costumavam sentar era ao lado do bebedouro, assim começando um processo de hidratação intenso.

No primeiro momento ela percebeu que eles falavam de pessoas, coisas do tipo: fulano é muito mau caráter, beltrana não dá mole pra ninguém, o Zé Mané quase ferrou a Neide da contabilidade, e assim foi dia após dia até que Ana conseguiu compor vários personagens para aquela história sem pé nem cabeça.

Mas, um belo dia, ela ouviu alto e claro o nome: Demóstenes Alicanto de Oliveira Neto, isso mesmo, esse nome enorme e inconfundível, que não poderia existir de forma alguma dois iguais, era ele mesmo, o Dedé, seu melhor amigo, parceiro de todas as horas, aqueles dois estavam esculachando o pobre do Dedé, falando horrores, inclusive sobre uma história que ele teria sido visto aos beijos com outro homem numa casa noturna GLS da cidade.

Nesse ponto a curiosidade de Ana ultrapassou os limites do aceitável e ela partiu pra cima, precisava desvendar aquilo, custasse o que custasse, pois ninguém ia ficar falando do Dedé, mesmo que aos segredos, na presença dela. Foi então que colocou a recepcionista na jogada para levantar as fichas dos dois e descobriu o nome, telefone e o endereço do trabalho deles. Nesse ponto, quase matou a charada, os dois trabalhavam no mesmo lugar que o Dedé, e através do amigo, descobriu que na Net, existia um blog específico, voltado para o local de trabalho do Dedé, que expunha a vida de todas as pessoas, sem exceção, do ascensorista ao Vice Presidente, uma verdadeira rede de intrigas, que estava sendo investigada a fim de descobrirem a origem do instrumento que já tinha prejudicado tanta gente.

Ana não falou nada ao Dedé sobre os dois, mas começou a armazenar provas, para desmascarar aquela dupla implacável de fofoqueiros que expunham as pessoas por mero prazer. Filmou, fotografou, gravou algumas das conversas sem ser notada, pois assim como eles usavam a academia como disfarce, ela também o fez em nome bem.

Passado algum tempo, e com provas suficientes contra os dois, Ana chamou o Dedé e contou tudo, mostrando-lhe todas as provas. O amigo ficou surpreso, pois aqueles dois estavam acima de qualquer suspeita, nunca foram vistos juntos, trabalhavam em departamentos diferentes e eram muito bem conceituados perante o grupo, faziam aquilo por puro prazer.

Foi então que Dedé teve uma ideia, em menos de uma semana haveria uma festa na empresa para comemorar o aniversário de fundação e seria uma excelente oportunidade para desmascarar os dois.

Dedé contou tudo para o rapaz responsável pelo TI que prontamente resolveu ajudar, como haveria uma transmissão de DVD da empresa como fundo para as comemorações, iriam exibir também o material apresentado por Ana, no momento em que estivessem todos concentrados na comemoração, acabando assim, com a maldade daquele dois.

Ana, graças a sua curiosidade, foi a responsável pelo fim de uma situação de extremo mau gosto e por que não dizer, criminosa. Ela continuou suas aulas na academia e cada vez mais, muito atenta e curiosa.

Quanto aos dois fofoqueiros, esses além de estarem sendo processados de forma coletiva por calúnia e difamação, perderam o emprego, nunca mais voltaram à academia e acho que jamais ousarão comentar sobre a vida de qualquer pessoa.

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